terça-feira, 3 de janeiro de 2023

Presidente discursa e repete erros e imprecisões ditas na campanha

Após subir a rampa do Palácio do Planalto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) discursou, na tarde do último domingo (1º), a milhares de apoiadores na Praça dos Três Poderes, em Brasília. Segundo a plataforma jornalística Aos Fatos, na fala, ele repetiu erros e imprecisões ditas na campanha de 2022, como a de que a fome foi extinta e que mais de 20 milhões de empregos formais foram criados nos governos petistas. O presidente, entretanto, acertou informações sobre o legado do PT, como o fato de o Brasil ter se tornado a sexta maior economia do mundo em 2011.

Entre os trechos selecionados e suas respectivas análises estão os seguintes:

...acabamos com a fome e a miséria, e reduzimos fortemente a desigualdade.

O Brasil não acabou com a fome nos mandatos de Lula e Dilma. Em nenhum momento da série histórica da pesquisa do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) sobre insegurança alimentar, iniciada em 2004, o país deixou de registrar milhões de pessoas na categoria “grave”, que é a que considera de fato a fome. O Brasil deixou o Mapa da Fome da ONU (Organização das Nações Unidas) em 2014, o que não significa que o país deixou de registrar pessoas com insegurança alimentar grave. Durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), o Brasil voltou ao Mapa da Fome, e o Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia de Covid-19 da Rede Penssan indicou que 33,1 milhões de pessoas não têm garantido o que comer. Sobre a miséria, embora tenha de fato caído durante os governos petistas, o Brasil também nunca deixou de registrar pessoas em situação de extrema pobreza, ou seja, com menos de US$ 1,90 de renda por dia. Segundo o IBGE, o menor índice foi atingido em 2014, ao final do primeiro mandato de Dilma Rousseff (PT), com 9,033 milhões de pessoas em extrema pobreza. Entre 2020 e 2021, houve o maior crescimento desse índice segundo registrado pela série histórica: três em cada dez brasileiros passaram a viver abaixo da linha da pobreza. (Fonte IBGE e G1).

Geramos mais de 20 milhões de empregos com carteira assinada e todos os direitos assegurados.

De acordo com os dados da Rais (Anuário Estatístico da Relação Anual das Informações Sociais), em 2002, um ano antes de Lula ocupar a Presidência, o país tinha 28,6 milhões de empregos formais. Já em 2015, último ano completo de Dilma Rousseff (PT) no poder, esse número era de 48 milhões. Nos 14 anos de governos petistas, portanto, foram criados 19,4 milhões de empregos de carteira assinada, e não mais de 20 milhões, como disse Lula. Se levarmos em consideração apenas os anos Lula (2003-2010), o saldo foi de 15,4 milhões, segundo a mesma base de dados. (Fonte MTE e Aos Fatos).

Tomamos medidas concretas para conter as mudanças climáticas, e reduzimos o desmatamento da Amazônia em mais de 80%.

O percentual de redução do desmatamento na Amazônia citado por Lula é maior do que o verificado no monitoramento do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). Em 2010, último ano do segundo mandato do petista, foram desmatados 7.000 km², uma redução de 72,4% sobre o apurado em 2002, último ano de Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Se for considerado o período de Dilma Rousseff no poder, o recuo é ainda menor: em 2015, último ano completo da petista, o desmatamento caiu 71,3%. Naquele ano, o indicador voltou a apresentar tendência de crescimento, o que gerou críticas de ambientalistas como Marina Silva (Rede), anunciada por Lula como atual ministra do Meio Ambiente. (Fonte: Inpe e EBC)

Fizemos superávit fiscal todos os anos,

A declaração só é verdadeira se Lula estiver se referindo aos seus oito anos de mandato. De fato, entre 2003 e 2010, o resultado das contas públicas foi superavitário (quando as receitas superam as despesas) em todos os anos. No entanto, o presidente costuma misturar em seus discursos dados econômicos que incluem o governo Dilma Rousseff (PT). Neste caso, a alegação de Lula estaria incorreta, já que o déficit fiscal se iniciou em 2014, durante o governo da petista, e perdura até hoje. (Fonte: Tesouro Transparente)  

eliminamos a dívida externa, ...

A dívida externa brasileira, resultado dos empréstimos e financiamentos do país com agentes estrangeiros, nunca foi quitada. Lula considera que o país teria eliminado esse débito internacional em 2008, quando passou a ter mais dinheiro em reservas (US$ 203 bilhões) do que o montante da dívida (US$ 196 bilhões), mas isso não significa que a dívida externa foi “eliminada”, como afirma o presidente. Em outubro de 2022, de acordo com dados do Banco Central, o Brasil possuía uma dívida pública federal externa estimada de US$ 319,6 bilhões, enquanto as reservas internacionais totalizavam US$ 331 bilhões. (Fonte: UOL e Tesouro Transparente).


...reduzimos a dívida interna a quase metade do que era anteriormente.


A dívida interna do país, que consiste no total de dinheiro que o governo pede emprestado a credores brasileiros quando faltam recursos para executar as despesas previstas no ano, cresceu durante os governos do PT. Em 2002, ano anterior ao primeiro mandato de Lula, a dívida interna líquida do governo federal e do Banco Central era de R$ 1,2 trilhão, em valores corrigidos pelo IPCA, o que correspondia a 24,4% do PIB. Em 2015, último ano completo de Dilma Rousseff no poder, a dívida chegou a R$ 3 trilhões, ou 35,5% do PIB. Considerando apenas a gestão Lula, finalizada em 2010, a dívida chegou a R$ 2,4 trilhões, ou 31,4% do PIB. Os dados são do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada). (Fonte: Ipea)

Depois de discursar na rampa do Palácio do Planalto foi a vez do presidente discursar no Congresso Nacional ao ser empossado. Ele citou informações incorretas sobre o legado do governo Bolsonaro, como a quantidade de obras paradas e a proporção de mortos pela pandemia no país. O petista, por outro lado, acertou ao afirmar que a credibilidade do sistema eleitoral brasileiro foi reconhecida internacionalmente e ao mencionar a redução de recursos da Saúde e do Meio Ambiente na gestão anterior.

Em diálogo com os 27 governadores, Lula disse:

Vamos definir prioridades para retomar obras irresponsavelmente paralisadas, que são mais de 14 mil no país.

De acordo com painel de acompanhamento de obras do TCU (Tribunal de Contas da União), existem hoje 8.674 obras paralisadas no país que, juntas, acumulam um investimento de R$ 6,9 bilhões. O número citado por Lula em seu discurso provavelmente se refere ao dado citado pelo mesmo tribunal em 2018, quando foram detectadas 14.403 obras paradas. (Fonte: TCU e Câmara dos Deputados)

Entre tantos desacertos nos dois discursos, o último deles, diz respeito ao número de mortes durante a pandemia de Covid 19. Disse o presidente:

Em nenhum outro país a quantidade de vítimas fatais foi tão alta proporcionalmente à população quanto no Brasil, ...

Na verdade, o Brasil registrou o 20º maior número de vítimas fatais por Covid-19 proporcionalmente à sua população, de acordo com dados do portal Our World in Data. Foram 3.222 mortes a cada 1 milhão de habitantes até o dia 31 de dezembro de 2022. Os primeiros colocados da lista são o Peru, com 6.409 mortes por milhão, a Bulgária, com 5.619 mortes por milhão, e a Bósnia e Herzegovina, com 5.018 mortes por milhão. Com população superior à do Brasil, os Estados Unidos aparecem na 19ª posição no ranking, com 3.229 mortes por milhão. (Fonte: Our World In Data). 

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