Ex-deputado e mais quatro
envolvidos foram denunciados por recebimento de vantagens indevidas e lavagem
de dinheiro. Recursos ilícitos foram usados em campanhas e na compra de bens
O Ministério Público Federal no Rio Grande do Norte
(MPF/RN) apresentou as duas últimas ações dentro da chamada Operação Pecado
Capital, que desbaratou um esquema de corrupção no Instituto de Pesos e Medidas
do Rio Grande do Norte (Ipem/RN), cujo funcionamento se deu principalmente
durante a gestão do ex-diretor geral Rychardson de Macedo, entre abril de 2007
e fevereiro de 2010. Trata-se de uma denúncia contra o ex-deputado Francisco
Gilson de Moura e outras quatro pessoas e uma ação por improbidade contra o
ex-parlamentar e um desses envolvidos.
Além do ex-deputado, também são acusados na denúncia
o filho da ex-governadora Wilma de Faria, Lauro Maia; o próprio Rychardson de
Macedo; o advogado Fernando Antônio Leal Caldas Filho e seu pai, Fernando
Antônio Leal Caldas. Já na ação por improbidade, Gilson Moura figura ao lado
apenas deste último, pois os demais denunciados já respondem pelos mesmos fatos
na esfera cível.
As ações demonstram que Gilson Moura recebeu R$ 1,2
milhão em propina, inclusive por meio de “doações eleitorais oficiais”, através
do uso de veículos contratados pelo instituto e desviados para utilização em
campanha, bem como mediante custeio de despesas eleitorais não informadas nas
prestações de contas (“caixa dois”). Os ilícitos envolvem tanto as eleições de
2008, quando concorreu à Prefeitura de Parnamirim; quanto as de 2010, quando se
reelegeu para a Assembleia.
Gilson Moura foi quem indicou Rychardson para a
diretoria do Ipem e se tornou - junto de Lauro Maia - um dos principais beneficiários
dos desvios de verbas. Fernando Antônio Leal Caldas Filho é apontado pelo MPF
como peça importante desse grupo, tendo servido de elo entre Lauro e o
ex-deputado. Já Fernando Leal, o pai, contribuiu com as irregularidades obtendo
documentos falsos.
Valores – O MPF indica que Gilson Moura recebeu R$ 30 mil mensais,
durante 34 meses, desviados do instituto. Desse dinheiro, parte foi revertida
para suas campanhas. Fora o repasse “regular”, foram pagos R$ 46.300 por meio
de oito supostas “doações eleitorais oficiais” de veículos, em 2008. Os
automóveis, na verdade, eram fruto de um contrato de locação do Ipem.
Fernando Leal Caldas é denunciado exatamente por ter
ajudado na obtenção de notas e recibos falsos para simular essas supostas
doações de automóveis. De acordo com depoimentos, coube a ele gerenciar meios
para tentar justificar a utilização ilícita dos veículos alugados pelo Ipem.
Alguns supostos doadores confessaram que assinaram a “doação” de veículos que
nem lhes pertenciam e outros afirmaram nunca ter feito doações, embora seus
nomes estejam na prestação de contas, pois assinaram recibos e contratos “a
pedido de Fernando Leal”. Um empresário, que alugou dois veículos à campanha,
foi registrado como tendo doado cinco.
O dinheiro desviado não foi todo para campanhas.
Algumas parcelas da propina foram usadas por Gilson Moura na aquisição de bens
de luxo, incluindo um terreno no Condomínio Bosque dos Poetas, em Parnamirim -
adquirido por R$ 206.251 totalmente em valores em espécie - e um apartamento no
flat Intercity Premium, em Natal, ambos registrados em nome de terceiros. Além
disso, foram comprados dois veículos da marca Land Rover. Um deles teve uma
parcela de seu financiamento, no valor de cerca de R$ 29 mil, quitada por
empresa de lavagem de dinheiro de Rychardson de Macedo, enquanto o outro teve
parte de seu preço pago com R$ 60 mil de verbas retiradas do Ipem.
O ex-deputado recebeu ainda R$ 167.600 por meio de 23
supostas “doações eleitorais oficiais” feitas através de depósitos em espécie,
para suas campanhas eleitorais. Dinheiro esse que na verdade consistia em
propina oriunda do esquema criminoso, maquiada através de recibos falsos. Até
fogos de artifício, trios elétricos e pesquisas eleitorais foram pagos com
recursos do Ipem, sem que tais despesas fossem declaradas nas prestações de
contas eleitorais.
Lavagem de dinheiro - Lauro Maia e Fernando Antônio Leal Caldas Filho foram
denunciados por lavagem do dinheiro desviado do contrato de locação de
automóveis do Ipem. A empresa contratada recebia valores superfaturados em suas
contas bancárias, sacava a quantia excedente em espécie e a repassava aos
acusados, que chegaram a depositar parte do montante em contas bancárias
pessoais.
A movimentação de valores em espécie foi a estratégia
usada para ocultar a origem ilícita do dinheiro. Uma parcela desses valores, no
montante de R$ 27 mil, foi repassada, como doação eleitoral, para a conta de
campanha de Lauro Maia a deputado estadual, nas eleições de 2010.
Ações - Até
março de 2015, já haviam sido ajuizadas 102 ações pelo MPF, apontando o
envolvimento de 79 pessoas e 24 empresas nas irregularidades cometidas no Ipem.
Dentre os denunciados estão também dirigentes do Instituto Nacional de
Metrologia (Inmetro), como o ex-auditor-chefe José Autran Teles e o ex-diretor
administrativo-financeiro Antônio Godinho.
As ações, todas de autoria do procurador da República
Rodrigo Telles, somam R$ 4,2 milhões em pedidos de ressarcimento aos cofres
públicos, em valores ainda não corrigidos. Esse dinheiro foi desviado através
de ilegalidades como a contratação de “funcionários fantasmas”, concessão
indevida de diárias, realização de fraudes em licitações e em contratos
administrativos, além da cobrança direta de propina, superfaturamento de gastos
e pagamento por serviços não prestados.
Os ganhos ilícitos decorrentes de dois dos contratos
que envolviam maior volume de recursos públicos no Ipem – um de fornecimento de
combustíveis e outro de locação de veículos – foram “repartidos” entre os
envolvidos, ficando Rychardson e Gilson Moura com o de fornecimento de
combustíveis e Fernando Caldas Filho e Lauro Maia com a verba desviada do
contrato de locação.
“Lauro Maia e Fernando Antônio Caldas Filho
garantiram a conivência do Governo do Estado do Rio Grande do Norte com a
verdadeira pilhagem aos cofres públicos promovida na autarquia estadual no
período, até mesmo porque ambos se beneficiavam do esquema”, destaca o MPF.
Memória - Em 2011, o Ministério Público Estadual do Rio Grande do Norte
deflagrou a “Operação Pecado Capital” para apurar o desvio de recursos públicos
no Ipem/RN. Por envolver recursos federais, repassados pelo Inmetro, o caso
passou à competência da Justiça Federal. O MPF deu continuidade às
investigações e, de 2012 a 2013, ajuizou 12 denúncias e 10 ações por
improbidade.
Em novembro de 2013, alguns dos acusados firmaram
acordo de colaboração premiada e apontaram o envolvimento direto do então
deputado estadual Gilson Moura e do filho da ex-governadora, Lauro Maia.
Rychardson de Macedo confirmou, assim como outros ex-diretores do Ipem, que o
deputado e Lauro, juntos com o advogado Fernando Antônio Leal Caldas Filho,
eram os destinatários finais da maior parte dos recursos desviados do
instituto, entre 2007 e 2010.
Pedidos – Na nova ação cível, Gilson Moura e Fernando Caldas, o pai,
responderão na Justiça por atos de improbidade administrativa (65 ao todo, no
caso do ex-deputado, e oito envolvendo Fernando) e o MPF requer a condenação de
ambos ao ressarcimento dos prejuízos (Gilson R$ 1.233.900 e Fernando R$
46.300); perda da função pública que eventualmente estejam ocupando; suspensão
dos direitos políticos; pagamento de multa; e proibição de contratar com o Poder
Público.
Na ação penal, Gilson Moura deve responder por
associação criminosa (artigo 288 do Código Penal), corrupção passiva (artigo
317) e lavagem de dinheiro (artigo 1º, inciso V, § 4o, da Lei n. 9.613/1998).
Lauro Maia responderá por associação criminosa, corrupção ativa (artigo 333 do
Código Penal) e lavagem de dinheiro, mesmos crimes pelos quais responderão
Fernando Antônio Leal Caldas e seu filho. Rychardson poderia responder por
corrupção ativa, mas o MPF requer a aplicação em seu favor do perdão judicial,
previsto no acordo de colaboração premiada.
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