"Desistir,
nunca. A gente sempre tem que caminhar nessa vida e não perder a fé em
Deus", diz o agricultor Gonçalo Vieira Ferreira, 71. Mesmo com as safras
de feijão perdidas por quatro anos consecutivos, ele prepara mais uma vez a
terra.
Morador
da zona rural de Juazeiro, norte da Bahia e epicentro do semiárido nordestino,
Gonçalo está a 55 quilômetros do rio São Francisco.
Mas
não tem água para produzir e o pouco que usa para beber e cozinhar vem de um
poço de captação irregular que divide com vizinhos do distrito de Massaroca.
Juazeiro,
assim como outras 1.001 cidades do Nordeste, está em situação de emergência por
causa da estiagem que perdura desde 2012. O número equivale a 55% dos
municípios de toda a região.
Gonçalo
Vieira se inscreveu para receber uma cisterna em sua casa, mas ainda não foi
contemplado.
O
ritmo do programa Água para Todos –que prevê a instalação de cisternas em casas
da zona rural do semiárido– foi desacelerado neste ano em meio ao cenário de
ajuste fiscal nas contas do governo.
Segundo
balanço do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), foram investidos entre
janeiro e julho deste ano R$ 174,1 milhões na implantação de cisternas –queda
de 45% em relação ao ano passado, quando foram aplicados R$ 333,9 milhões no
mesmo período.
Cada
cisterna tem capacidade para 16 mil litros, o suficiente para abastecer por
oito meses uma família de cinco pessoas.
"O
jeito é se virar com o pouco de água que tem para manter a família e não deixar
morrer os animais", diz Gonçalo, que cria cabras nos fundos da casa.
Uma
das coordenadoras da ASA (Articulação do Semiárido Brasileiro), Valquíria Lima
cobra a retomada do ritmo da instalação de cisternas, consideradas essenciais
para garantir água para consumo próprio e produção agrícola.
"Esse
é um tema que não pode sair da pauta do governo e da sociedade, nem ser alvo de
cortes com o ajuste fiscal", afirma.
SAFRA
PERDIDA
No
semiárido baiano, onde são raras as áreas com irrigação, a safra dos
agricultores familiares já foi considerada perdida, segundo o coordenador
estadual de Defesa Civil, Rodrigo Hita.
Diógenes
Barbosa, engenheiro agrônomo e professor do IFBA (instituto federal da Bahia),
explica que as chuvas em algumas regiões do semiárido no início do ano não
foram suficientes para reabastecer barreiros e barragens.
"Tivemos
um pouco de chuva que criou a falsa impressão de que a seca tinha arrefecido.
Mas ela continua firme em toda a região", diz Barbosa. Segundo ele, o mês
de agosto marca o início do período mais crítico da estiagem, que vai até
novembro.
O
Ministério da Integração Nacional diz que "não houve redução nos
investimentos do programa Água para Todos" e que os aportes para a
implementação das tecnologias de abastecimento foram feitos segundo o fluxo de
instalações.
Segundo
o ministério, a meta inicial de instalação de 750 mil cisternas foi atingida em
dezembro de 2014.
CARROS-PIPA
Enquanto
o governo federal reduz os investimentos em cisternas, os gastos com
carros-pipa não param de crescer. Nos últimos três anos, só o governo federal
investiu R$ 2,4 bilhões na contratação dos "pipeiros".
Eles
chegam a percorrer mais de 100 km em busca de água potável para abastecer áreas
rurais.
O
investimento é equivalente a quase um terço do orçamento de R$ 8 bilhões da
transposição do rio São Francisco, a principal obra de abastecimento hídrico em
andamento e que está 76,7% executada.
Apenas
neste ano foram R$ 453 milhões investidos no abastecimento das famílias com
carros-pipa.
Ao
todo, são 6.705 "pipeiros" contratados em 780 em cidades do Nordeste.
DEPENDÊNCIA
"O
carro-pipa traz uma dependência para as famílias e cria currais eleitorais. Há
políticos que comandam a distribuição da água e depois, nas eleições, vêm
cobrar a fatura", diz José Alves Duarte, do Sindicato dos Trabalhadores
Rurais de Juazeiro.
Em
nota à Folha, o Ministério da Integração Nacional diz que o programa de
carros-pipa segue critérios técnicos.
A pasta afirma, ainda, que contratação, fiscalização e pagamento dos "pipeiros" é feita pelo Exército.
A pasta afirma, ainda, que contratação, fiscalização e pagamento dos "pipeiros" é feita pelo Exército.
Fonte: http://www1.folha.uol.com.br
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