O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, protocolou na tarde
desta quinta-feira (20) no STF (Supremo Tribunal Federal) denúncia
contra o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). O deputado é
acusado pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro no
esquema da Petrobras que é investigado pela Operação Lava Jato.
A defesa de Cunha afirmou que ainda não teve acesso ao documento produzido pela PGR (Procuradoria-Geral da República), mas que a acusação é "é facilmente derrubável".
Nesta tarde, Janot também denunciou o senador Fernando Collor (PTB-AL) e o ex-ministro Pedro Paulo Leoni Ramos também por suposta participação no esquema investigado pela Polícia Federal.
Segundo a denúncia (veja a íntegra aqui ), Cunha recebeu US$ 5 milhões em propina
após o fechamento de contratos entre a Petrobras e a Samsung Heavy
Industries, da Coreia, para fornecimento de navios-sondas para a estatal
do petróleo. Além da condenação criminal, Janot pede na denúncia a
restituição "do produto e proveito dos crimes" no valor de US$ 40
milhões e a reparação dos danos causados à Petrobras e à administração
pública, também no valor de US$ 40 milhões.
Desde a abertura do inquérito no STF, em março passado, Cunha tem negado
qualquer envolvimento com as irregularidades e afirmado ser alvo de perseguição de Janot e do Palácio do Planalto.
A partir de agora, o ministro relator dos casos relacionados à Lava Jato
no STF, Teori Zavascki, deve submeter a denúncia aos colegas ministros
do STF que decidirão, em sessão plenária, se acolhem ou rejeitam a
denúncia –ainda não há prazo para a decisão. Se acolhida, a denúncia
torna-se ação penal e Cunha passa à condição de réu.
A apresentação da denúncia não significa culpa formada, mas sim que a
PGR considerou ter encontrado, na investigação conduzida com o apoio da
Polícia Federal, indícios que considera suficientes para processar e
julgar o deputado federal por determinados crimes.
INVESTIGAÇÕES
A investigação sobre Cunha começou a partir de depoimento, prestado em
acordo de delação premiada, pelo doleiro Alberto Youssef em outubro de
2014 à força tarefa da Operação Lava Jato em Curitiba (PR).
Segundo o doleiro, o operador da Samsung Heavy Industries e de uma
empresa parceria, a Mitsui, Júlio Gerin Camargo, pagou propina a Cunha a
partir do fechamento de contratos da empresa com a Petrobras. Foram
assinados dois contratos para fornecimentos dos navios-sondas Petrobras
10.000 e Vitória 10.000, com a anuência do então diretor da área
internacional da petroleira, Nestor Cerveró.
Os dois contratos custaram aos cofres da Petrobras um total de US$ 1,2 bilhão.
Segundo Youssef, a propina foi paga por Camargo ao lobista Fernando Soares, o Baiano, por meio de remessas ao exterior.
O doleiro contou que em determinado momento os pagamentos da Samsung a
Camargo cessaram, o que impediram o operador de continuar pagando
Baiano.
Ele também disse que, para pressionar Camargo a retomar os pagamentos,
Eduardo Cunha então apresentou, por meio de outros parlamentares do
PMDB, requerimentos na Câmara para pedir investigações do TCU e do
Ministério de Minas e Energia sobre Camargo e a empresa Mitsui, uma
parceria da Samsung no negócio dos navios-sondas.
Os registros da Câmara indicaram que a deputada federal Solange Almeida
(PMDB-RJ), também atingida pela denúncia, de fato apresentou
requerimentos no sentido de se ouvir Camargo e as empresas.
Em abril, a Folha revelou que o nome do deputado aparecia como
autor dos arquivos de computador em que foram redigidos os requerimentos
protocolados por Solange. Semanas depois, o Ministério Público Federal
realizou diligências na Câmara para fazer cópias do material.
Procurada, Solange Almeida afirmou que não esperava ser denunciada, mas não quis comentar.
O operador Júlio Camargo também fechou um acordo de delação premiada com
a Lava Jato, porém a princípio não confirmou a propina a Eduardo Cunha.
A versão mudou por volta de março deste ano, quando, em novos
depoimentos à PGR, Camargo confirmou a história narrada por Youssef.
Um processo tramita no Paraná sobre o mesmo assunto, mas tendo por foco o
diretor da área internacional da Petrobras, Nestor Cerveró. Ao ser
ouvido pelo juiz Sergio Moro em audiência naquele processo, Camargo
também confirmou ter pago propina a Cunha.
Segundo Camargo, Cunha disse "não ter nada pessoal" contra o operador,
mas que "havia um débito" de Camargo "com o Fernando no qual ele [Cunha]
era merecedor de US$ 5 milhões e que isso estava atrapalhando porque
estava em véspera de campanha" e o deputado "tinha uma série de
compromissos".
Depois dessa conversa, Camargo disse que votou a pagar a propina, por
meio de repasses a empresas controladas por Baiano no exterior.
As investigações da Lava Jato em Curitiba comprovaram que Camargo fez
pagamentos a Baiano em dois momentos: US$ 14 milhões entre 2006 e 2007 e
R$ 4,4 milhões. Essa segunda fase de repasses, segundo Camargo, está
relacionada às cobranças de Eduardo Cunha. Em suas alegações finais no
processo, Camargo disse que pagou o deputado "sob ameaças".
As investigações da Operação Lava Jato indicaram que de fato as empresas
de Camargo remeteram, em 12 operações, um total de R$ 4,4 milhões entre
dezembro de 2011 e outubro de 2012 para empresas controladas por
Baiano. Os requerimentos da deputada Solange datam do segundo semestres
de 2011, antes dos primeiras repasses.
Em sentença,
Moro escreveu que "restou provado pelo menos o pagamento de US$ 14,3
milhões e de R$ 4,4 milhões de vantagem indevida" a Nestor Cerveró e
Fernando Baiano. Convertendo os dólares em reais, o juiz apontou um
total de R$ 54 milhões "como produto do crime". Em sua decisão, Moro
condenou os réus a devolverem o valor aos cofres públicos.
A investigação da Lava Jato demonstrou que Baiano era o controlador das
contas abertas em nome das firmas offshore Three Lions Energy, mantida
no banco Leu, em Genebra, da Falcon Equity, na Suíça, e da 3 Lions Heavy
Industries em Hong Kong.
O juiz federal condenou Baiano a 16 anos de prisão e Cerveró, a 12 anos e
três meses. Camargo também foi condenado, mas teve a pena abrandada por
ter feito o acordo de delação premiada a se comprometido a devolver
dinheiro.
OUTRO LADO
Cunha disse estar 'absolutamente sereno' com a denúncia a seu respeito e afirmou ser inocente.
O advogado de Nestor Cerveró, Edson Ribeiro, afirmou que o ex-diretor da
Petrobras nunca recebeu vantagens indevidas ou esteve envolvido em
esquemas criminosos no exercício do cargo na área internacional da
estatal. Segundo Ribeiro, as provas obtidas nas investigações da Lava
Jato confirmam a inocência de Cerveró.
A Folha não conseguiu contato com a defesa de Fernando Soares. Em
manifestações anteriores, os advogados de Soares negam que ele tenha se
beneficiado ou atuado no repasse de propinas de fornecedoras da
Petrobras.
A reportagem não localizou representantes da empresa Mitsui.
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