domingo, 7 de junho de 2015

UM PESO, DUAS MEDIDAS - GOVERNADOR PROMOVE OFICIAIS ENCRENCADOS COM A LEI



Robinson Faria esqueceu o que publicou três dias antes da promoção e elevou funcionalmente pelo menos um major amigo e correligionário em seu partido, o PSD, em detrimento do que consta nos autos sobre o maior escândalo que já atingiu a Polícia Militar. 
Robinson Faria, entre o coronel Ângelo e Kalina: todos três sabiam
que os dois oficiais não deveriam ser promovidos.
Devido a questões morais e legais e especificamente a processos em andamento na instituição fardada e na justiça potiguar, repercutem muito mal entre outros graduados da Polícia Militar do Rio Grande do Norte algumas das 110 promoções de oficiais da corporação que o governador Robinson Faria positivou no “Diário Oficial do Estado” da última terça-feira, 2.
O desagrado também grande no braço do ministério público estadual dedicado ao combate à corrupção. Um de seus expoentes lastimou que os promotores e policiais se esforcem no combate a recebedores de propina e depois os vejam receber prêmios das mãos do Governador.
Em pelo menos um caso, o Governador elevou funcionalmente um amigo e correligionário no seu partido, o PSD, embora dias antes o houvesse referenciado no “Diário Oficial” como submetido ao julgamento do poder judiciário.
As promoções que mais atraíram críticas foram as do tenente coronel Wellington Arcanjo de Morais a coronel e do Major André Luís Fernandes da Fonseca a tenente coronel. Este foi denunciado recentemente por crime de tortura e o primeiro ainda não se livrou da acusação de recebimento de propina que motivou sua prisão, em 2011.

Palavra quebrada
Desde terça-feira outros oficiais se perguntam onde Robinson enterrou a garantia que deu ao povo potiguar, entre suas eleição e posse, em outubro de 2014 e 1° de janeiro último, de que seu governo não patrocinaria ninguém que estivesse encrencado com a justiça. Foi desta premissa que ele tirou então outra garantia que esqueceria logo depois, a de que não entregaria cargos de confiança a quem não pudesse lhe fornecer certidão de que não estava sendo investigado ou não houvesse sido condenado por improbidade administrativa ou crime assemelhado.
Como dizem os oficiais decepcionados, eles até entenderiam que, de modo geral, Robinson não conhecesse as folhas corridas dos dois oficiais aos quais contemplou, pois até tomar posse na chefia do executivo não acompanhava o dia-a-dia da Polícia Militar. Mas não compreendem como sua principal conselheira na área, a secretária estadual de Segurança, delegada de polícia Kalina Leite Gonçalves, não lhe mostrou a incongruência e os riscos das duas nomeações e não evitou que seu chefe nomeasse desta forma oficiais pendurados na justiça, no ministério público e nas áreas de corregedoria e inteligência da pasta e da Polícia Militar.





Três dias depois de citá-lo como pendurado na
justiça, Robinson promoveu o
correligionário major Fernandes a coronel.


Há muitos anos na cúpula da secretaria de Segurança, Kalina integrava o estafe da sua pasta quando estouraram os dois problemas que agora contra-indicariam essas promoções.  
Num dos casos, porém, não haveria como atribuir o erro governamental a Kalina, ou ao comandante geral da polícia, coronel Ângelo Mário de Azevedo. Pois a responsabilidade de se lembrar do que assina é do próprio Robinson.
Amnésia partidária
Somente uma horrível crise de amnésia poderia levar Robinson a canetar a promoção de Fernandes, até recentemente comandante da Primeira Companhia Independente de Policia Militar, baseada em Macau, porque a punição que se abateu sobre o oficial não é coisa do tempo do ronca, anterior à sua chegada ao Centro Administrativo.
Pelo contrário, é gritante a prova de que Robinson era quem mais sabia da incapacitação legal que impedia momentaneamente Fernandes de ascender na carreira. Afinal de contas, foi o próprio Robinson quem descreveu o impedimento. Este fato, aliás, mostra que hoje em dia o Governador não mais se lembra de acontecimentos que protagonizou 72 horas atrás.
De fato, a apenas três dias antes de canetar a promoção do major, a 29 de maio Robinson fez publicar no mesmo “Diário Oficial” o impeditivo legal, funcional e moral. Ele se consubstanciou em portaria que assinou ao lado de Kalina, agregando o major André Luís Fernandes da Fonseca, “matrícula nº 112.805-1”, a contar de 22 de maio último, “por se ver processado, após ficar exclusivamente à disposição da Justiça Comum, após ter DENÚNCIA RECEBIDA no processo nº 0400088-89.2010.8.20.001 – Comarca de São Gonçalo do Amarante/RN” (os termos aparecem aqui da mesma forma como são vistos no “Diário Oficial” de 29 de maio último).
A única explicação para tão célere “up grade” moral só poderia residir numa amnésia partidária.
Suplente forte
Há tempos o major Fernandes é um colaborador político de Robinson.  É destacado quadro do PSD, partido que o chefe do executivo preside no Rio Grande do Norte desde 2011. Em 2014, graças à proteção que Robinson lhe deu, ele chegou a se candidatar a Deputado Estadual pela legenda, sob o número 55.190, a despeito de estar sendo investigado por determinação judicial. Conseguiu então chegar à primeira suplência.
Pouco depois de o norte-rio-grandense ir às urnas, Fernandes se movimentou muito – e, segundo consta, com o respaldo de Robinson – para desembarcar na Assembléia Legislativa em detrimento de seu correligionário Rudson Lisboa, o “Disson”, o eleito menos votado, que foi empossado em janeiro e até hoje permanece como Deputado Estadual em nome do PSD. Na época, a propósito, este esforço foi explicado como tentativa de se blindar contra uma condenação pela justiça.
Homicídio
Para merecer a filiação partidária e receber de Robinson apoios desse jaez, o major deve ser pessoa a quem o Governador conhece muito bem, talvez mais intimamente do que Disson, um de seus principais aliados políticos no Agreste desde os anos noventa. Sendo oficial mantido “sub judice”, entretanto, sua elevação funcional não poderia ocorrer por escolha subjetiva do inquilino da Governadoria, principalmente se, três dias antes, este o havia apontado, com detalhes, como pendurado pela justiça na comarca de São Gonçalo do Amarante.  
O novo coronel Arcanjo foi preso sob a acusação de receber propina de
empresários no maior escândalo que já manchou a reputação da polícia potiguar.



Com 23 anos na Polícia Militar, o major foi denunciado em 2011 como autor de um homicídio na zona Norte de Natal por uma testemunha do caso, que seria nada menos do que a esposa da vítima.
Prisão da quadrilha
Quanto ao tenente-coronel Arcanjo, o que Robinson deveria saber é que o oficial está pendurado desde 4 de julho de 2011, quando foi preso, ao lado de colegas e subordinados de farda e de empresários de Assu, Mossoró, Natal, Paraú e Pendências, numa operação em que a própria Polícia Militar e o ministério público estadual caçavam suspeitos de corrupção fardada.
Mobilizando onze promotores de justiça e mais de oitenta policiais, a operação “Batalhão Mall” efetivou quinze mandatos de prisão e seis de busca e apreensão expedidos pela justiça.
Sequenciando investigações conduzidas havia aproximadamente nove meses por promotores de Justiça do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime (Gaeco) e do Núcleo de Controle Externo da Atividade Policial (Nucap), a “Batalhão Mall” expôs um dos maiores escândalos de corrupção que já desabaram sobre a Polícia Militar.
Em decorrência da operação, Arcanjo foi acusado especificamente de receber propina dos empresários.
Como “limpar” a polícia?
Segundo informação liberada pelo ministério público, a ofensiva teve o objetivo de “desarticular organização criminosa responsável pelo cometimento reiterado de crimes de corrupção ativa, passiva e peculato contra a Administração Pública Militar, através de negociatas com pontos bases de viaturas e vendas do serviço policial, especificamente: vendas de escolta de transporte de valores e de vigilância 24 horas, tudo com o uso de viaturas, estrutura da Polícia Militar e Policiais em serviço, e também mediante apropriação de combustível extraído ilicitamente de viatura”. O esquema investigado funcionava com policiais do décimo Batalhão da Polícia Militar, baseado em Assu.
Acima de tudo, a operação constituiu um esforço do ministério público com o objetivo de “limpar” a polícia militar, que se empenhava em cumprir a missão de prevenção geral do seu sistema punitivo, de modo a inibir práticas semelhantes e a reforçar a necessidade de probidade no exercício da função policial, especialmente no que tange a padrões éticos e assépticos na relação entre a corporação e a iniciativa privada.
Pelo visto, dizem oficiais da polícia militar, diferente é o que Robinson pensa a respeito da corporação.

Nenhum comentário :

Postar um comentário