Robinson Faria esqueceu o que publicou três dias
antes da promoção e elevou funcionalmente pelo menos um major amigo e
correligionário em seu partido, o PSD, em detrimento do que consta nos autos
sobre o maior escândalo que já atingiu a Polícia Militar.
Robinson Faria, entre o coronel Ângelo e Kalina: todos três sabiam que os dois oficiais não deveriam ser promovidos. |
Devido a
questões morais e legais e especificamente a processos em andamento na
instituição fardada e na justiça potiguar, repercutem muito mal entre outros
graduados da Polícia Militar do Rio Grande do Norte algumas das 110 promoções
de oficiais da corporação que o governador Robinson Faria positivou no “Diário
Oficial do Estado” da última terça-feira, 2.
O
desagrado também grande no braço do ministério público estadual dedicado ao
combate à corrupção. Um de seus expoentes lastimou que os promotores e
policiais se esforcem no combate a recebedores de propina e depois os vejam
receber prêmios das mãos do Governador.
Em pelo
menos um caso, o Governador elevou funcionalmente um amigo e correligionário no
seu partido, o PSD, embora dias antes o houvesse referenciado no “Diário
Oficial” como submetido ao julgamento do poder judiciário.
As
promoções que mais atraíram críticas foram as do tenente coronel Wellington
Arcanjo de Morais a coronel e do Major André Luís Fernandes da Fonseca a
tenente coronel. Este foi denunciado recentemente por crime de tortura e o
primeiro ainda não se livrou da acusação de recebimento de propina que motivou
sua prisão, em 2011.
Palavra quebrada
Desde
terça-feira outros oficiais se perguntam onde Robinson enterrou a garantia que
deu ao povo potiguar, entre suas eleição e posse, em outubro de 2014 e 1° de
janeiro último, de que seu governo não patrocinaria ninguém que estivesse
encrencado com a justiça. Foi desta premissa que ele tirou então outra garantia
que esqueceria logo depois, a de que não entregaria cargos de confiança a quem
não pudesse lhe fornecer certidão de que não estava sendo investigado ou não
houvesse sido condenado por improbidade administrativa ou crime assemelhado.
Como
dizem os oficiais decepcionados, eles até entenderiam que, de modo geral,
Robinson não conhecesse as folhas corridas dos dois oficiais aos quais
contemplou, pois até tomar posse na chefia do executivo não acompanhava o
dia-a-dia da Polícia Militar. Mas não compreendem como sua principal
conselheira na área, a secretária estadual de Segurança, delegada de polícia
Kalina Leite Gonçalves, não lhe mostrou a incongruência e os riscos das duas
nomeações e não evitou que seu chefe nomeasse desta forma oficiais pendurados
na justiça, no ministério público e nas áreas de corregedoria e inteligência da
pasta e da Polícia Militar.
Três dias depois de citá-lo como pendurado na justiça, Robinson promoveu o correligionário major Fernandes a coronel. |
Há muitos anos na cúpula da secretaria de Segurança, Kalina integrava o estafe da sua pasta quando estouraram os dois problemas que agora contra-indicariam essas promoções.
Num dos
casos, porém, não haveria como atribuir o erro governamental a Kalina, ou ao
comandante geral da polícia, coronel Ângelo Mário de Azevedo. Pois a
responsabilidade de se lembrar do que assina é do próprio Robinson.
Amnésia partidária
Somente
uma horrível crise de amnésia poderia levar Robinson a canetar a promoção de
Fernandes, até recentemente comandante da Primeira Companhia Independente de
Policia Militar, baseada em Macau, porque a punição que se abateu sobre o
oficial não é coisa do tempo do ronca, anterior à sua chegada ao Centro
Administrativo.
Pelo
contrário, é gritante a prova de que Robinson era quem mais sabia da
incapacitação legal que impedia momentaneamente Fernandes de ascender na
carreira. Afinal de contas, foi o próprio Robinson quem descreveu o
impedimento. Este fato, aliás, mostra que hoje em dia o Governador não mais se
lembra de acontecimentos que protagonizou 72 horas atrás.
De fato,
a apenas três dias antes de canetar a promoção do major, a 29 de maio Robinson
fez publicar no mesmo “Diário Oficial” o impeditivo legal, funcional e moral.
Ele se consubstanciou em portaria que assinou ao lado de Kalina, agregando o
major André Luís Fernandes da Fonseca, “matrícula nº 112.805-1”, a contar de 22
de maio último, “por se ver processado, após ficar exclusivamente à disposição
da Justiça Comum, após ter DENÚNCIA RECEBIDA no processo nº 0400088-89.2010.8.20.001
– Comarca de São Gonçalo do Amarante/RN” (os termos aparecem aqui da mesma
forma como são vistos no “Diário Oficial” de 29 de maio último).
A única
explicação para tão célere “up grade” moral só poderia residir numa amnésia
partidária.
Suplente forte
Há tempos
o major Fernandes é um colaborador político de Robinson. É destacado
quadro do PSD, partido que o chefe do executivo preside no Rio Grande do Norte
desde 2011. Em 2014, graças à proteção que Robinson lhe deu, ele chegou a se
candidatar a Deputado Estadual pela legenda, sob o número 55.190, a despeito de
estar sendo investigado por determinação judicial. Conseguiu então chegar à
primeira suplência.
Pouco
depois de o norte-rio-grandense ir às urnas, Fernandes se movimentou muito – e,
segundo consta, com o respaldo de Robinson – para desembarcar na Assembléia
Legislativa em detrimento de seu correligionário Rudson Lisboa, o “Disson”, o
eleito menos votado, que foi empossado em janeiro e até hoje permanece como
Deputado Estadual em nome do PSD. Na época, a propósito, este esforço foi
explicado como tentativa de se blindar contra uma condenação pela justiça.
Homicídio
Para
merecer a filiação partidária e receber de Robinson apoios desse jaez, o major
deve ser pessoa a quem o Governador conhece muito bem, talvez mais intimamente
do que Disson, um de seus principais aliados políticos no Agreste desde os anos
noventa. Sendo oficial mantido “sub judice”, entretanto, sua elevação funcional
não poderia ocorrer por escolha subjetiva do inquilino da Governadoria,
principalmente se, três dias antes, este o havia apontado, com detalhes, como
pendurado pela justiça na comarca de São Gonçalo do Amarante.
O novo coronel Arcanjo foi preso sob a acusação de receber propina de empresários no maior escândalo que já manchou a reputação da polícia potiguar. |
Prisão da quadrilha
Quanto ao
tenente-coronel Arcanjo, o que Robinson deveria saber é que o oficial está
pendurado desde 4 de julho de 2011, quando foi preso, ao lado de colegas e
subordinados de farda e de empresários de Assu, Mossoró, Natal, Paraú e
Pendências, numa operação em que a própria Polícia Militar e o ministério
público estadual caçavam suspeitos de corrupção fardada.
Mobilizando
onze promotores de justiça e mais de oitenta policiais, a operação “Batalhão
Mall” efetivou quinze mandatos de prisão e seis de busca e apreensão expedidos
pela justiça.
Sequenciando
investigações conduzidas havia aproximadamente nove meses por promotores de
Justiça do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime (Gaeco) e do Núcleo de
Controle Externo da Atividade Policial (Nucap), a “Batalhão Mall” expôs um dos
maiores escândalos de corrupção que já desabaram sobre a Polícia Militar.
Em
decorrência da operação, Arcanjo foi acusado especificamente de receber propina
dos empresários.
Como “limpar” a polícia?
Segundo
informação liberada pelo ministério público, a ofensiva teve o objetivo de
“desarticular organização criminosa responsável pelo cometimento reiterado de
crimes de corrupção ativa, passiva e peculato contra a Administração Pública
Militar, através de negociatas com pontos bases de viaturas e vendas do serviço
policial, especificamente: vendas de escolta de transporte de valores e de
vigilância 24 horas, tudo com o uso de viaturas, estrutura da Polícia Militar e
Policiais em serviço, e também mediante apropriação de combustível extraído
ilicitamente de viatura”. O esquema investigado funcionava com policiais do
décimo Batalhão da Polícia Militar, baseado em Assu.
Acima de
tudo, a operação constituiu um esforço do ministério público com o objetivo de
“limpar” a polícia militar, que se empenhava em cumprir a missão de prevenção
geral do seu sistema punitivo, de modo a inibir práticas semelhantes e a
reforçar a necessidade de probidade no exercício da função policial,
especialmente no que tange a padrões éticos e assépticos na relação entre a
corporação e a iniciativa privada.
Pelo
visto, dizem oficiais da polícia militar, diferente é o que Robinson pensa a
respeito da corporação.
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