Texto: Catarina
Buriti (Assessoria de Comunicação do Insa)
O Semiárido
brasileiro possui mais de um milhão e setecentos mil estabelecimentos rurais
agropecuários, segundo dados do Sistema de Gestão da Informação e do
Conhecimento do Semiárido Brasileiro (Sigsab). Deste total, cerca de 90% é
ocupado pela agricultura familiar. Assim, considerando suas particularidades
ambientais, é de fundamental importância buscar e promover alternativas, por
meio de pesquisa científica e participativa, para a convivência sustentável na
região.
A agricultura
familiar constitui um sistema complexo e diverso, que funciona sob uma lógica
distinta da economia empresarial. Uma das principais características é que o
trabalho da família é elemento central no processo de geração de riqueza no
âmbito do agroecossistema. Grande parte da riqueza produzida é utilizada para o
auto-sustento, ou seja, apropriada pela própria unidade familiar e contribui
para garantir sua segurança alimentar.
Um projeto do
Instituto Nacional do Semiárido (Insa/MCTI), em parceria com a Articulação
Semiárido Brasileiro (ASA), há dois anos mapeia as estratégias utilizadas pelos
agricultores dos diversos estados que integram o Semiárido brasileiro para
minimizar os efeitos da prolongada falta de chuvas. O projeto visa acompanhar
100 famílias que implementaram infraestruturas hídricas em suas propriedades a
partir da execução dos projetos do Programa 1 Milhão de Cisternas (P1MC) e do
Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2), pela ASA.
Viabilidade econômica
No período de 11 a 13
de maio, pesquisadores do projeto se reuniram em Campina Grande (PB) para
realizar a análise econômica e ecológica dos agroecossistemas estudados, com
foco na conquista da estabilidade e da autonomia pelas famílias para conviver
com os longos períodos de estiagem.
Os resultados
preliminares da pesquisa apontam que a implementação de tecnologias sociais nas
propriedades rurais tem sido um dos fatores que promovem a resiliência social.
Oriundo da Física e adaptado aos estudos da sociedade, o termo resiliência se
refere à capacidade de as comunidades se recuperarem de eventos extremos, como
é o caso das longas estiagens e escassez de recursos. Com o aumento e a
estabilização dos níveis produtivos em anos normais de chuva, os agricultores
apresentam maior capacidade de enfrentar os períodos prolongados de estiagem.
A história da
trajetória das famílias estudadas demonstra que o acesso a políticas públicas
de terra e água, bem como a capacidade de se organizarem coletivamente para
participação social, têm permitido a produção e apropriação das riquezas e
propiciado maior autonomia e melhores condições para enfrentar os períodos mais
críticos de escassez.
Paulo Petersen, da
AS-PTA, organização integrante da ASA, destaca que a estratégia fundamental
para promover a convivência com o Semiárido é que a maior parte das riquezas
produzidas no agroecossistema fique para a família, a fim de lhe propiciar
maior independência em relação ao mercado externo.
Segurança hídrica
Uma das famílias
acompanhadas pela equipe do projeto é a de dona Josélia e seu Carlos Marcolino,
da comunidade Furnas, município de Areial (PB). O agroecossistema gerido pela
família, de cerca de 8 hectares, tem como principal característica a
diversidade produtiva e o permanente processo de inovação, a fim de se ajustar
às mudanças nas condições internas e externas.
Para garantir a
segurança hídrica e alimentar durante a seca, o casal possui na propriedade
cinco tecnologias para armazenamento de água, que são: cisterna calçadão, de
consumo, tanque de armazenamento de água, tanque de pedra e barreiro.
Essas tecnologias
sociais têm garantido uma infraestrutura hídrica para captar e armazenar água
de chuva para consumo humano e para a produção de hortifrutigranjeiros
(provenientes de hortas, pomares e granjas) e derivados da pecuária durante o
período de escassez. Esses produtos tanto são utilizados para o auto-consumo,
propiciando segurança alimentar para a família, como são canalizados para a
venda. Devido aos baixos custos produtivos, a riqueza gerada favorece o
crescimento econômico da família e do território.
Outras inovações
também foram adaptadas ao agroecossistema familiar, como a silagem, a
tecnologia de esterqueira para conservar e melhorar a fertilidade do solo e um
fogão ecológico. Essas tecnologias têm contribuído para a autonomia e
sustentabilidade da economia familiar, bem como para a manutenção do
agroecossistema. Como resultado, a família depende da compra de poucos alimentos
para consumo humano, como arroz, sal, temperos, macarrão; para consumo animal,
adquirem somente o esterco, via Fundo Rotativo Solidário. É autônoma na
produção do café, farinha, milho, silagem, macaxeira e feijão.
A economia que
organiza o trabalho na agricultura familiar é baseada em valores locais,
comunitários, em práticas e conhecimentos tradicionais passados de geração em
geração. Mas isso não significa que não sejam eficientes na produção de valores
financeiros. Trabalhando em harmonia com os ciclos da natureza, produzem com
baixos custos produtivos, gerando riquezas que alimentam o desenvolvimento
local. Por essa razão, é fundamental que as políticas públicas considerem e
fortaleçam as particularidades desse tipo de economia.
O Insa desenvolve diversas
ações relacionadas a tecnologias de captação de água de chuva, infraestrutura
de armazenamento hídrico e capacitação para que as famílias possam se apropriar
de técnicas que permitem um melhor aproveitamento da água. O diretor do Insa,
Ignacio Salcedo, destaca a importância de se promover ações relacionadas a
estocagem e armazenamento de água como estratégia fundamental para viabilizar a
convivência com o Semiárido brasileiro, bem como a segurança alimentar, hídrica
e a sustentabilidade social e econômica das pessoas que vivem nas propriedades
rurais.
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