domingo, 8 de março de 2015

Pesquisadores brasileiros extraem composto contra HIV de soja transgênica

A novidade, com biofábricas para a cianovirina, é uma realização da Embrapa em parceria com o Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos e a Universidade de Londres.
O pesquisador Elíbio Rech, da Embrapa: foram necessários seis anos para se chegar à etapa atual
O pesquisador Elíbio Rech, da Embrapa: foram necessários seis anos para se chegar à etapa atual
A biotecnologia está a cada dia propondo novos rumos para a indústria farmacêutica. A novidade é que pesquisadores da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) conseguiram extrair e purificar a cianovirina cultivada em soja transgênica, uma proteína presente em algas que é capaz de impedir a multiplicação do vírus HIV no corpo humano.

A pesquisa foi publicada pela revista científica "Science" e comprova que as sementes de soja geneticamente modificadas constituem, até o momento, a biofábrica mais eficiente e uma opção viável para a produção em larga escala da proteína.

Os novos rostos da epidemia de Aids

“Estamos trabalhando para atingir esta etapa há cinco ou seis anos. Pudemos acumular grande quantidade de cianovirina dentro da soja e conseguimos purificá-la”, explica o pesquisador da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, Elíbio Rech.
Desenvolvida desde 2005, a pesquisa com biofábricas para a cianovirina é feita em parceria com o Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos e a Universidade de Londres. O objetivo é produzir um gel com propriedades viricidas, para que as mulheres apliquem na vagina antes do relacionamento sexual.
O pesquisador, ressalta que o gel não é uma vacina contra a Aids nem um substituto ao preservativo, mas um coadjuvante importante no sistema. “O nosso foco é principalmente a África, onde grande parte das mulheres são contaminadas com HIV pelos parceiros. Na cultura de muitos países o uso do preservativo não é respeitado. Com o produto, a mulher não precisa da opção do homem em querer usar ou não, ela mesma pode se prevenir."
Segundo a Embrapa, se a soja transgênica for plantada em uma estufa menor do que um campo de beisebol (97,54 metros) é possível fornecer cianovirina suficiente para proteger uma mulher por 90 anos.
Os biofármacos, ou medicamentos biológicos, são obtidos por meio de fontes ou processos biológicos a partir do emprego industrial de microrganismos ou células modificadas geneticamente. A técnica consiste em inserir genes de interesse em genomas de plantas que possam assimilar suas propriedades e, a partir daí, produzir proteínas modificadas em larga escala, idênticas às originais.
Segundo Rech, a origem do trabalho foi se voltar para a agricultura: “Então começamos a avaliar o uso da soja e do tabaco não só para o agronegócio, mas indo para o setor farmacêutico e para o setor industrial".
Para ele, as pesquisas com biofármacos fomentam o mercado farmacêutico, fazendo com que os medicamentos cheguem ao consumidor com menor custo, e valorizam ainda mais o agronegócio brasileiro, já que agrega valor às plantas.
Durante as próximas fases de desenvolvimento, os cientistas também contarão com a colaboração do Conselho de Pesquisa Científica e Industrial da África do Sul. Segundo a Embrapa, países em desenvolvimento com altos índices de proliferação da Aids terão licença de produção e uso interno livre de pagamento de royalties.
A Embrapa, em conjunto com outras instituições, estuda ainda biofábricas para produção do fator IX, utilizado para tratamento da hemofilia tipo B, uma doença hemorrágica, de herança genética, que leva à perda de mobilidade do paciente.
Os pesquisadores também desenvolvem uma soja que produzirá o hormônio do crescimento humano (hGH), utilizado por pessoas com distúrbios do crescimento, e ainda trabalham com o isolamento de genes de aranhas da biodiversidade brasileira, com o objetivo de desenvolver fibras sintéticas como as da teia de aranha, flexíveis e resistentes. Para explicar os possíveis usos da fibra, Rech faz uma comparação com o plástico – "serve para quase tudo".
O trabalho intenso com soja tem uma razão para o pesquisador. Além de a planta possuir um sistema de produção consolidado no Brasil, biologicamente é excelente pelo fato de 40% da semente ser proteína e o restante, óleo.“A soja é uma planta maravilhosa. Fazemos a manipulação que quisermos”, resume Rech.

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