Fonte: Gazeta do Povo
Em reunião ministerial, Dilma defende as medidas que
condenava durante a campanha eleitoral – e que ela mesma adotou, uma vez
mantida no poder pelas urnas.
A campanha de Dilma Rousseff, que
buscava a reeleição, foi pródiga em frases de efeito, umas ditas em debates,
outras espalhadas por meio de seus perfis em mídias sociais, como o Twitter e o
Facebook. Algumas delas viraram mote recorrente ao longo da disputa eleitoral,
com repetições constantes, como “Tem coisas que eu não concordo, como mexer nos
direitos do trabalhador e não abro mão nem que a vaca tussa!”; ou, então,
referindo-se aos adversários do PSDB: “Eles plantam inflação pra colher juros”.
O tema ainda rendeu outra frase: “Asseguro que esse povo da autonomia do Banco Central
quer o modelo anterior. Querem fazer um baita ajuste, um baita superávit
primário, aumentar os juros para danar, reduzir empregos e reduzir salário”. E,
ainda, falando a taxistas em São Paulo: “Não vai haver tarifaço”. Quem
acreditou nisso tudo deve estar no mínimo surpreso com o primeiro mês do
segundo mandato de Dilma.
Na verdade, mesmo antes da posse
boa parte desse discurso já tinha sido jogado no lixo. Na semana imediatamente
posterior à vitória petista no segundo turno, o Comitê de Política Monetária já
começava a subir a taxa básica de juros, a Selic, que passou de 11% para 11,25%
ao ano. Esse ainda foi o mais leve dos aumentos pós-eleição: em cada uma das
duas reuniões seguintes do Copom, a Selic subiu mais meio ponto percentual, e
agora está em 12,25%. Tudo isso para, entre outras coisas, segurar a inflação,
que terminou 2014 em 6,41% – muito perto do teto de tolerância da meta do Banco
Central – e, em 2015, pode estourar os 6,5% com os aumentos em itens como
energia elétrica, transporte coletivo e combustíveis. Alguns deles tiveram os
preços represados, ou reduzidos na canetada por Dilma como forma de fazer
populismo tarifário, prática que se mostrou irresponsável e insustentável.
Também antes da posse o “nem que
a vaca tussa” foi desmentido por mudanças em benefícios como o
seguro-desemprego, a pensão por morte, o abono salarial e o auxílio-doença. E,
já no começo do ano, veio o “impostaço”: aumentos nas alíquotas do IOF, do
PIS/Cofins, da Cide e do IPI, sem falar no veto de Dilma à correção de 6,5% na
tabela do Imposto de Renda, o que corresponde a um aumento indireto no IR pago
pela pessoa física. Não é nosso objetivo hoje tratar do acerto ou do erro
dessas medidas – algumas delas já foram comentadas neste espaço dias atrás. A
questão é o uso recorrente da mentira por parte de Dilma Rousseff, que passou a
campanha toda negando a adoção do que Armínio Fraga chamou de “medidas
impopulares”. Pior: ela exortou a população a não votar em seus adversários
justamente porque eles, no poder, fariam o que a presidente Dilma está fazendo
agora. Os candidatos que, durante a campanha, adotaram um discurso mais
realista sobre a economia foram rechaçados em nome de uma visão com lentes
cor-de-rosa do estado das contas públicas. O eleitor foi simplesmente enganado.
Isso só tem um nome: estelionato eleitoral.
E, em uma rara aparição pública
desde que as “medidas impopulares” começaram a ser anunciadas – no caso, uma
reunião ministerial na terça-feira passada, na Granja do Torto –, Dilma não
teve escrúpulos de defender as medidas que acusava seus adversários de querer
implantar no Brasil, e, com isso, defendeu também a negação de seu discurso de
campanha, classificando como “necessários para manter o rumo” os “ajustes” que
estava fazendo. Ora, as medidas são justamente a prova de que “o rumo” que
vinha sendo tomado até agora não podia ser “mantido”, mas deveria ser
corrigido, pois estava levando o país à estagflação. Dilma ainda pediu aos
ministros uma “batalha da comunicação” que basicamente consiste em negar o óbvio
com veemência, até que todos estejam convencidos da mentira. Resta saber se era
isso o que os eleitores de Dilma esperavam quando a escolheram para seguir
presidindo o país até 2018.
Dê sua opinião
Você concorda com o editorial?
Deixe seu comentário e participe do debate.
Nenhum comentário :
Postar um comentário