quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

Barragem Armando Ribeiro - Água pelo ralo



Por Cláudio Santos
Desembargador/Presidente do TJRN    
Matéria postada originalmente na Tribuna do Norte
De há muito, na condição de cidadão e orgulhoso sertanejo, observo com especial atenção o reiterado desacerto com a gerência de águas neste Estado. Não sei se há decisão técnica nem a que órgão público cabe tal atribuição, mas é fato que ocorre completa e histórica irresponsabilidade ou excesso de otimismo, neste último caso mais calcado em subjetivo entendimento pessoal do gestor, do que em conhecimento local do problema, que é o mais sério que a sociedade potiguar enfrenta, há décadas, notadamente os cidadãos mais pobres.

 Cito apenas dois exemplos pontuais, que servem de 3x4 para o resto do Estado: a barragem Passagem das Traíras, localizada entre Jardim do Seridó, São José e Caicó, até um dia desses, entrando no semestre passado, estava soltando água em abundância, ao longo do leito do rio,  sem que ninguém estivesse fazendo a conta custo/benefício. Mas, de verdade, sei que era para aguar capim para uma dúzia de pequenos criadores de meia dezena de vacas nos sítios à jusante. Ou para levar água para amenizar o calor do lazer na Ilha de Sant’Ana. Hoje está seca!
O outro exemplo, que os jornais estamparam por esses dias, é que a Barragem “Armando Ribeiro Gonçalves” continua a soltar água em abundância... Se for para saciar a sede das cidades ao longo do rio Açu, talvez pelo leito do rio não seja o canal mais adequado, dado o eloquente desperdício. Se for para aguar bananas... Aí é questão de completa falta de juízo, pois para os trabalhadores que labutam nessa atividade existe o legal seguro-desemprego.

Com essas breves premissas, pergunta-se a quem se detém o dever de responder: se não chover (toctoctoc) para fazer água nos grandes reservatórios, de onde vai se tirar o precioso líquido (como diziam os antigos locutores de rádio) para os cidadãos potiguares?

O inverno (?) deste ano já é atrapalhado, para ser otimista, no mínimo. Quando o inverno é  bom, o rio Seridó já desce de barreira a barreira desde janeiro, o que mais nunca se viu.  Já não tem água para o povo beber em dois terços das cidades de portes médio e pequeno. As lagoas que abastecem Natal estão muito abaixo da média. O lençol que atende às populações do oeste já apresenta problemas significativos, pois a estrutura de retirada d’água é antiga e obsoleta para períodos críticos. Há contaminação frequente.

O fato é que não há, na atual conjuntura de crise d’água potável em todo o mundo, em particular no Brasil, e mais especialmente no semi-árido, uma política realista de gestão prudente e técnica, que não comporta, ao meu entender, nenhuma possibilidade de agricultura irrigada, a não ser a partir de poços no alto oeste, e, mesmo assim, de forma mais racional, sem os abusos atuais.

A Barragem Armando Ribeiro Gonçalves é um reservatório que quando chegar à metade de sua capacidade, não pode mais soltar nenhum volume, pois inúmeras são as populações urbanas e rurais que dependem daquela água, cada dia mais escassa. Lembrem-se: sempre pode ser estiado o próximo. O problema é grande e preocupante. Hoje caminhões-pipa percorrem até 200 km para buscar água, que não mais há.

Acredito ser urgentes providências administrativas – dos governos e Prefeituras -, com iniciativas de solução emergencial e circunstancial e rigor na gestão, inclusive no varejo, desde se proibir gastos supérfluos em qualquer cidade, como lavagem de carros e calçadas, ainda com o reforço de  forte campanha publicitária para sensibilizar a todos os  potiguares.

 O Poder Judiciário do Estado está a postos para respaldar as ações governamentais objetivando minimizar o problema e efetivar o rigor das medidas de interesse público que possam e devam ser tomadas.

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